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Os labirintos estrangeiros das “dívidas ocultas” de Moçambique


Dívidas deixam rasto de subornos, enganos e prejuízos na Rússia, Holanda, Grã-Bretanha e EUA.

Para além dos moçambicanos a serem julgados no Maputo, o escândalo das dívidas ocultas é também um vasta teia de indivíduos e companhias no estrangeiro e que envolve já tribunais na Inglaterra, Estados Unidos e África do Sul.

No centro das atenções no estrangeiro está o banco suíço Credit Suisse que foi de onde partiram as centenas de milhões de dólares para o financiamento de uma frota de pesca de atum, segurança marítima e desenvolvimento de docas marítimas a serem compradas à companhia Privinvest.

Os subornos que lubrificaram os empréstimos

Para poder efectuar a compra, o governo moçambicano precisava de empréstimos numa altura em que organizações financeiras internacionais se opunham a mais empréstimos antes de Moçambique estabilizar a sua economia. Daí a necessidade de manter os empréstimos em segredo e daí também a necessidade de se pagar subornos para se poder avançar o acordo e a entrega dessas centenas de milhões de dólares à Privinvest.

Sabe-se agora que milhões de dólares foram pagos a entidades moçambicanas com alegações feitas num tribunal americano que a companhia Privinvest teria pago subornos a entidades do Credit Suisse e do governo moçambicano para garantir o contrato e que entre as entidades moçambicanas que teriam recebido subornos conta-se o actual Presidente Filipe Nyusi.

Isto foi revelado aquando do julgamento em Nova Iorque do funcionário da Privinvest, Jean Boustani.

Boustani foi preso pelas autoridades americanas sob acusação de ter participado no esquema de corrupção em que a Credit Suisse vendeu depois a dívida moçambicana a investidores americanos a quem foi dito que a dívida estava a ser usada para legítimas actividades governamentais.

Três empregados da Credit Suisse declararam-se culpados de terem recebido os subornos de Boustani para facilitarem a concessão do crédito por esse banco mas Boustani foi absolvido pelo júri americano que aceitou a sua defesa de que embora tivesse na verdade pago os subornos nunca tinha tido qualquer papel na venda da dívida moçambicana a investidores americanos.

O estado moçambicano alega agora que como os empréstimos foram obtidos ilegalmente e não tem que os pagar e a Credit Suisse afirma por seu que os três empregados actuaram ilegalmente sem conhecimento da estrutura do banco pelo que não é responsável por essas acções.

Os empréstimos da Credit Suisse que o governo moçambicano quer ver anulados por serem parte de “um esquema fraudulento”, ascendem a 622 milhões de dólares.

As autoridades moçambicanas disseram há um ano atrás que iam pedir a extradição dos três empregados da Credit Suisse Andrew Pearse, Detelina Subeva and Surjan Singh.

As autoridades americanas querem também julgar o antigo ministro das finanças moçambicano Manuel Chang que se encontra preso na África do Sul à espera de uma decisão sobre pedidos de extradição dos Estados Unidos e Moçambique.

Moçambique perde em tribunal britânico

Mas para além de individualidades, o escândalo envolve agora também acções em tribunal envolvendo o estado moçambicano, a Credit Suisse e um banco russo, VTB.

Um tribunal do Reino Unido autorizou a empresa Privinvest a abrir um processo contra o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, uma reacção ao processo movido pelas autoridades de Maputo àquela companhia.

Em 2019, as autoridades de Moçambique entraram com uma acção contra a Privinvest e o seu director executivo Isakandar Safa em Londres na tentativa de recuperar os empréstimos e receber compensação. Mas já este ano um tribunal de recurso britânico negou o julgamento afirmando que a questão deve ser resolvida em arbítrio conforme os acordos assinados para caso de disputa.

Advogados de Moçambique disseram que iam apelar da decisão.

A empresa Privinvest, com sede em Abu Dabhi, nega irregularidades, mas reconhece ter feito pagamentos a dirigentes moçambicanos, incluindo Filipe Nyusi, e ao partido no poder Frelimo. No entanto, considera que foram contribuições legais para a campanha eleitoral de Nyusi e Frelimo e não subornos.

A empresa de construção naval acrescenta em forma de argumento que se os pagamentos fossem subornos, Nyusi e os outros também seriam culpados por aceitá-los.

Banco russo e fundos de investimento vão também a tribunal

Por outro lado o banco russo VTB iniciou uma acção na Grã-Bretanha contra o estado moçambicano exigindo o pagamento de 535 milhões de dólares que disse terem sido pagos como parte do negócio .

O VTB disse que tinha durante três anos tentado negociar o pagamento da dívida com o governo moçambicano mas sem sucesso

Cerca de 60% do banco é controlado pelo governo russo.

Para complicar ainda mais toda este rede internacional investidores internacionais, incluindo o Banco Comercial Português e o United Bank of Africa, iniciaram uma acção contra a Credit Suisse, o governo moçambicano e uma companhia estatal por milhões de dólares que dizem ter investido em títulos de dívida vendidos pela Credit Suisse e que o governo moçambicano se recusa a pagar.

Estas acções envolvem os fundos de investimento VR Capital Group e Farallon Capital Partner, foram iniciadas em Fevereiro deste ano

Estes fundos compraram cerca de 30 milhões de dólares dos empréstimos..

Um porta voz representando os dois fundos disse à agência Bloomberg que “membros do grupo investiram em boa fé e com base em acordos jurídicos, mas a dívida está agora em “default” e não é paga há quatro anos”.

Por outro lado da Holanda uma companhia foi multada em 716 mil dólares por ter participado na venda desses títulos que prejudicaram os seus compradores.

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