"Eu sonhava com uma Angola mais solidária" - Escritor Henrique Guerra

Henrique Guerra

O autor que passou mais de oito anos nas prisões da era colonial acaba de publicar um livro de contos "O Tocador de Quissanje"
O escritor e activista angolano Henrique Guerra lamentou “o exclusivismo” da actual sociedade angolana que ele gostava de ver mais solidária e integrada.

Para o escritor, que passou mais de oito anos nas prisões portuguesas durante a era colonial, é de lamentar que hoje haja quem se sinta mais angolano do que outros.

Guerra falava por ocasião do lançamento do seu último livro que tem como aspecto central a realidade da era colonial em Angola com os seus problemas diários e as suas contradições.

“O Tocador de Quissanje” é com efeito a mais recente obra literária do escritor publicada pela União dos Escritores Angolanos (UEA), no passado mês de Fevereiro em Luanda.


Your browser doesn’t support HTML5

Hnerique Guerra lamenta actual situação em Angola - 18:14



“A obra constitui uma galeria de quadros sugestivos, onde a realidade colonial angolana, com todos seus contrastes e contradições, se vai vislumbrar, transportando-nos quase para universos cinematográficos,” escreveu a professora Irene Guerra Marques no prefácio do livro.

O livro contém seis contos, escolhidos de um caderno escrito no início dos anos sessenta e guardado por um amigo do autor durante mais de vinte anos.

Guerra disse à Voz da América que “os contos são diferentes entre si” procurando ser um retrato “parcial” da sociedade colonial “ dos inícios dos anos 60”.

Um dos contos visa também retratar “a Luanda antiga dos anos 40 e as transformações que vai sofrendo”.

A maior parte dos contos, disse, passam-se no meio rural, explicando “ as dificuldades que o meio rural apresentava na altura” como “ a falta de desenvolvimento, traumatizada”.

Membro fundador da UEA, onde exerceu as funções de Secretário das Actividades Culturais e também membro fundador da União Nacional dos Artistas Plásticos (UNAP), foi presidente da direção desta associação nas suas duas primeiras comissões directivas.

É autor de “Cubata Solitária” (Contos), 1962, “Quando Me Acontece Poesia”, (Poemas) 1976, “Alguns Poemas”, 1978, “Angola – Estrutura Económica e Classes Sociais” (Ensaio), “O Circo de Giz de Bombó” (Teatro) 1979 e “Três Histórias Populares” (Contos), 1989.

Guerra esteve oito anos e meio preso em Portugal até 1973 durante a época colonial.
Guerra é humilde em relação à sua actividade política em prol do MPLA afirmando que foi condenado “a uma pena excessiva em relação aquilo que eu fiz”.

“Não posso dizer que fiz muito pelo partido, “ disse.

“Tentei fazer alguma coisa mas não aconteceu,” acrescentou, afirmando ainda em resposta a uma pergunta se se sente ignorado pelo MPLA “que isso não compete à minha pessoa”.

“Quem deve responder a isso é o próprio movimento, eu não sei,” acrescentou.

Guerra queixou-se da parca reforma que obtém do governo pois foi elaborada no tempo do “kwanza burro”.

“Tiraram-lhe seis zeros e o que recebo não dá para as necessidades da vida,” disse.

Guerra recuou-se a criticar a actual situação em Angola afirmando que embora não esteja plenamente satisfeito “ fez-se a Angola que foi possível”.

Disse no entanto que aquando da luta de libertação “sonhava com uma Angola mais solidária e mais integrada”.

A Angola que se vive hoje “é um bocado exclusivista”.

“Há grupos que excluem os outros que pensam que são os únicos angolanos, “ disse o escritor.

“Não pensava que pudesse haver tanta divisão como há", acrescentou o escritor.

Para Guerra a democracia “quer dizer governo do povo para o povo mas não existe muito isso”.

Contudo, devido às realidades angolanas “não sei se seria possível outro tipo”, disse.