Centenas de mulheres e raparigas sentem ainda os efeitos da violência física e psicológica pós-eleições de 2007-2008, no Quénia.
Um novo relatório do Observatório dos Direitos Humanos, apresentado hoje, sublinha que o governo não prestou nenhum apoio.
Pelo menos 900 mulheres e raparigas foram vítimas da violência pós-eleitoral e muitos casos não foram divulgados. Segundo a organização, a falta de cuidados médicos deixou muitas sobreviventes incapazes de trabalhar ou continuar a estudar, sendo relegadas à pobreza.
Jacqueline Mutere conta que um amigo de um vizinho entrou na sua casa usando a força, alegando a procura de protecção. O homem pretendia de facto manter relações sexuais à força, o que Mutere não permitiu. No seu quarto, dormiam também os filhos menores.
O homem ficou extremamente violento. Mutere diz que a agressão criou-lhe deficiência na audição.
Agnes Odhiambo, pesquisadora sénior do Observatório dos Direitos Humanos, conta que “as mulheres contraíram lesões - na coluna, pernas - porque os violadores eram brutos, chutavam, batiam e cortavam-nas com catanas”.
Ela acrescenta que em resultado disso “elas passam noites em branco, não se concentram no trabalho e não se deve esquecer que além de terem sido violadas, elas perderam as suas casas, seus maridos e filhos…”
Algumas mulheres foram violadas por grupos que iam até dez homens, nalgumas vezes na presença de crianças. Após isso, elas foram estigmatizadas pelos maridos e comunidades. Outras contraíram doenças sexualmente transmissíveis, outras ficaram grávidas.
Sendo o aborto ilegal no Quénia, mesmo em casos de violação, algumas recorrem ao aborto clandestino, o que resultou em complicações internas. As que se mantiveram grávidas, hoje enfrentam a discriminação, os filhos também.
Quando as mulheres apresentavam as queixas de violação, muitas vezes eram solicitadas a localizar o violador e apresentar à polícia, ou eram acusadas de mentir por motivações politicas.
O governo reconheceu ter havido actos de violação, mas não ofereceu qualquer assistência às vítimas.
O Observatório dos Direitos Humanos apela ao governo para usar o fundo de “reposição de justiça” de 9,8 milhões de dólares, anunciado em 2015, para apoiar as sobreviventes, em particular no tocante a serviços de saúde e psicossociais.