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Dívida angolana e geopolítica marcam visita de João Lourenço à China


Presidente angolano, João Lourenço, com Presidente chinês, Xi Jinping, durante a cimeira China África em Pequim. 2 de Setembro 2018
Presidente angolano, João Lourenço, com Presidente chinês, Xi Jinping, durante a cimeira China África em Pequim. 2 de Setembro 2018

Presidente angolano inicia na sexta-feira, 15, visita de três dias em que o pagamento de dívida será um assunto “incontornável”

O Presidente angolano realiza a partir desta sexta-feira, 15, uma visita oficial de três dias à China, na qual vai encontrar-se com o seu homólogo, Xi Jinping, com o primeiro-ministro, Li Qiang, e o presidente do Parlamento, Zhao Leji.

A China é, atualmente, o maior credor de Angola, ao abrigo de várias linhas de crédito abertas pelo Governo de Pequim, através de bancos estatais.

Até 2019, a dívida angolana era calculada em cerca de 23 mil milhões de dólares e o pagamento feito com o valor da venda de petróleo,

Para analistas económicos e políticos angolanos, o pagamento de dívida será um assunto “incontornável” durante as discussões, a par do investimento chinês em Angola, em meio à atual concorrência de investidores americanos em vários setores da economia, em particular no Corredor do Lobito, que inicialmente tinha sido adjudicado a empresas chinesas.

Empréstimos e mais empréstimos

O especialista em gestão de empresas Estevão Gomes considera a China "um parceiro estratégico para Angola nos últimos 20 anos e uma fonte primordial de financiamento a médio e longo prazo”.

Ele aponta a "renegociação da dívida" como uma das razões principais da visita de João Lourenço.

Aquele economista entende que a presença de empresas chinesas em Angola é uma forma do país asiático reafirmar a sua condição de um dos líderes económicos mundiais em África.

“A disputa entre a China e os EUA representa a luta geopolítica para ver quem terá o domínio da gestão dos investimentos e da exploração dos recursos naturais em Angola”, sublinha Estevão Gomes.

Aquele analista económico também lamenta a forma como foi gasto os empréstimos chineses por gestores angolanos, a ponto de uma boa parte ter caído nas mãos de particulares.

“Porque estrategicamente a China confiou, naquela altura, na transparência que o nosso Governo apresentava a nível da gestão pública. Mas agora o Governo chinês exigiu que os timings que foram estabelecidos para o ressarcimento da dívida fossem cumpridos na íntegra, causando praticamente o défice cambial no nosso mercado”, sustenta Estevão Gomes.

Jogos geopolíticos

Cesário Zalata, especialista em relações internacionais, considera que a disputa do mercado angolano entre a China e os EUA faz parte da luta pela influência em África, levada a cabo pelas duas potências económicas mundiais.

“ E Angola tem estado a fazer uma diplomacia inteligente de cortesia que não entra em colisão quer com a China quer com os EUA”, aponta.

Zalata destaca o investimento chinês em Angola depois da guerra civil, mas dá nota negativa ao fato de o valor real da dívida angolana nunca ter sido revelado e de muito dinheiro emprestado pela China ter parado na mão de alguns dignitários angolanos em detrimento do Estado.

“Razão pela qual há aqui uma espécie de vergonha de se poder divulgar o nível real da dívida porque se esse valor for anunciado as pessoas darão conta que grande parte desse dinheiro não foi utilizada para benefício de interesses públicos ”, aponta Cesário Zalata.

Entretanto, o jornalista Ilídio Manuel é de opinião que a abertura de Angola ao investimento americano pode não estar a agradar a China por receio de perder ou reduzir o volume de investimentos, a favor de empresas americanas.

Manuel ressalta que o fato de Pequim ter ficado seis meses sem nomear um embaixador para Angola “significa que houve irritante diplomático”, que, em última instância, pode também levar a China a pressionar o pagamento da dívida “nos moldes em que foi acordado”.

“Os americanos podem também não estar a ver com bons olhos (a presença chinesa), uma vez que o objetivos da sua aproximação à África é justamente reduzir a influência chinesa”, conclui aquele analista político.

Agenda em Pequim

Na sequência das conversas do Presidente angolano com as mais altas entidades da China, uma declaração conjunta deve ser divulgada, segundo a nota de imprensa enviada às redacções.

Nesta sua segunda visita oficial a Pequim, João Lourenço vai ainda participar num fórum de negócios sobre investimento em Angola e conversar com empresários chineses, incluindo os que já atuam no mercado nacional.

A delegação presidencial tem previstas deslocações à província de Xandong para contatos com setores da indústria têxtil, farmacêutica e agrícola.

Maior parceiro em África

Desde 2007, Angola é o maior parceiro comercial da China em África, com um volume de negócios que registou, só em 2010, um total de 24,8 mil milhões de dólares norte-americanos.

Dez anos mais tarde, o valor das trocas comerciais com a China ascendeu os 61 por cento, ou seja, para 5,55 mil milhões de dólares.

Em 2018, a China aprovou uma nova linha de financiamento de dois mil milhões de dólares norte-americanos.

Esta parceria assenta-se na igualdade e benefícios mutuamente vantajosos, e pode, também, para além de contribuir para o desenvolvimento dos dois países, ajudar no estabelecimento de uma nova ordem política e económica internacional e promover a democratização das relações internacionais.

Em Angola, a China opera nos mais variados domínios da vida económica e social do país, com forte presença nas áreas de formação de quadros, caso da construção e apetrechamento do Centro Integrado de Formação Tecnológica (CINFOTEC) e da Academia Diplomática Venâncio de Moura e bolsas de estudos para os jovens angolanos.

As relações entre Angola e a China datam de 1983 e conheceram o seu ponto mais alto a partir de 2000 quando o gigante asiático começou a fazer empréstimos ao país para a reconstrução de infraestruturas destruídas pela guerra e para alavancar a economia nacional.

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