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Crime vai aumentar nas cidades angolanas, avisam sociólogos


Andar em Luanda é arriscar ser atropelado, roubado, assassinado ou “violado ao andar de taxi”, queixou-se um jurista angolano exemplificando assim o sentimento de insegurança que se vive na capital angolana e noutras partes do país.

Isto ao mesmo tempo que alguns peritos avisam que o crime deverá continuar a aumentar.

A polícia afirma que a situação está controlada e que a a criminalidade é na realidade “estável” mas um sociólogo avisa que face às dificuldades económicas porque passam os cidadãos o crime deverá aumentar.

 SEGURANÇA PÚBLICA E CRIMES EM ANGOLA - 21:30
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Analistas divergem-se nas opiniões sobre as questões de segurança pública, mas são unânimes em apontar as causas deste sentimento destacando, entre outros, factores como o deficit na execução de políticas públicas, a crise financeira e a crise de valores morais.

A capital angolana foi palco de dois crimes com características comuns no modo de actuação dos marginais e nas suas motivações e que chocaram a sociedade. O primeiro ocorreu em Dezembro no Talatona, zona nobre da cidade de Luanda. Um cidadão foi alvejado na via pública à bordo da sua viatura quando saía de uma agência bancária.

No mesmo distrito, no princípio do corrente mês, foi vítima o sociólogo e académico Laurindo Vieira quando saía igualmente de uma agência bancária. As circunstâncias da morte ainda não estão devidamente esclarecidas, contudo cinco cidadãos foram publicamente apresentados pelo Serviço de Investigação Criminal como presumíveis autores.

A polícia garante que se tratam de crimes de fórum comum e isolados que não põem em causa a segurança pública da capital angolana de modo geral.

"A situação da criminalidade na capital angolana é estável", disse em recente entrevista à imprensa o porta-voz do Comando da Polícia em Luanda, Nestor Goubel, tendo acrescentado que "Luanda é uma cidade cosmopolita, dinâmica. Tivemos um balanço positivo da segurança pública na passagem de ano, mas ainda assim temos que assinalar esses casos isolados que acabam de alguma forma por beliscar e causar uma espécie de sentimento de insegurança", explicou.

Os factores económicos têm pesado muito sobre os problemas sociais e, no caso da segurança pública não é uma excepção, afirma o sociólogo Garcia Quitari para quem os desafios de segurança pública em Angola vão além da criminalidade violenta.

«A criminalidade é um estágio que é normalmente precedida de outras formas de violências anterior, como por exemplo, a violência discursiva, a violência simbólica e neste sentido podemos pensar que o agravamento da pobreza também é uma forma de violência”, afirmou.

“Portanto, a segurança pública tem que ser entendida deste ponto de vista mais abrangente. Ela tem que incluir a violência doméstica, a criminalidade juvenil, a sinistralidade rodoviária», acrescentou.

A segurança pública em Luanda é “quase inexistente”, diz o Jurista José Ndimba Candeeiro para quem “os riscos de andar em Luanda estão no azar de ser atropelado ao fazer travessias pelas estradas, de ser roubado ao andar pelos bairros, de ser desviado para morte, ou violado ao andar de táxi”.

«A segurança pública em Luanda é muito frágil, porque se está a criar um ambiente “selvagélico” onde cada um já começa a criar um clima de medo contra qualquer pessoa com a qual se cruze», referiu o advogado.

Falando sobre os critérios definidos pelas Nações Unidas para considerar uma zona insegurança, o sociólogo Carlos Conceição referiu que «se considera um estado ou uma zona insegura naqueles em que no espaço de um quilómetro ao quadrado regista-se assalto de um a dez cidadãos entre os quais três resultam me mortes num espaço de tempo de 30 minutos».

Para ao analista social, em relação à Luanda, há a sensação de elevados índices de insegurança pública a nível de toda sua extensão territorial devido aos factos criminosos registados nos últimos tempos e de forma sequencial, embora as autoridades afirmassem que a situação da criminalidade esteja controlada. Estudos concretos devem ser feitos, diz o sociólogo. "Nós somos aproximadamente cerca de 10 milhões de habitantes e não se esperaria o diferente e, com outros riscos: a desorganização social, desurbanidade, a cidade não obedece aos critérios urbanísticos modernos. Tem várias outras variáveis que poderiam efectivamente concorrer para isto", explicou.

Os crimes, maioritariamente cometidos com recursos à arma de fogo, leva a que a socióloga Marlene Messele considere como "fraca a segurança pública em Luanda" e, entre as razões aponta o número insuficiente de efectivos das forças da ordem e, consequentemente o deficit no policiamento das zonas vulneráveis para além da falta de meios materiais para dar respostas oportunas às várias ocorrências criminosas.

Para a analista social, entre as causas mais frequentes e impulsionadoras do cometimento de crimes consta o desemprego, a desestruturação familiar, o consumo de substâncias entorpecentes, falta de controlo de familiares e de organizações educacionais. Os impostos elevados, a inflação e a pobreza extrema constam igualmente da lista de factores que concorrem para o surgimento de criminosos nas ruas, o que impacta na sensação de insegurança pública aos cidadãos.

"Existe uma relação entre a criminalidade e os problemas sociais e económicos. Quando o barril de petróleo sobe de preço e a cesta básica não é proporcional ao poder de compra das famílias, uma vez que o salário base nacional ronda perto dos 33 mil kwanzas (equivalente em USD 39), o que não corresponde com o valor real da cesta básica, que ronda a volta dos 70 a 100 mil kwanzas (USD 85), podemos considerar este facto como um fenómeno político e económico que impacto no meio social", disse.

O que está base do aumento dos crimes em Luanda tem a ver com a crise social económica e financeira e de valores que de modo geral o país tem estado a atravessar, de acordo com o sociólogo Carlos Conceição para quem "o país entrou numa crise económica e financeira sem precedente em 2014".

Os níveis de criminalidade, do ponto de vista das sondagens sociais poderão aumentar nos próximos tempos, avança o sociólogo.

"De 2014 para cá já se arrastam 10 anos e não houve avanço. Há recuos do ponto de vista do estilo de vista dos próprios cidadãos, e das perspectivas para o futuro, quase que há uma estagnação. Não horizonte temporal para se melhora ao curto trecho esta situação. Cada dia que passa as coisas vão piorando e o estado de vida vai se degradando e adicionado a isto está a questão do desemprego. Isto colide efectivamente com esta situação e demonstra o fracasso das políticas públicas voltadas para acudir o sector social", afirmou.

A nível económico as análises económicas apontam para um crescimento demográfico acima de 2,8 % em relação ao crescimento do PIB, o que, na visão do economista Félix Sikito, pressupõe que teremos mais famílias e menos postos de trabalho o que trará implicações económicas e sociais.

"O ano 2024 é desafiador, mas nos apresenta uma luz no fundo do túnel, ou seja, uma esperança se de facto colocarmos em prática aquilo em que foi apostado. É preciso apostar mais no sector não petrolífero para diversificar a economia nacional", referiu.

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