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Do centro da capital libanesa ... - 2005-04-06


Deslocar-se do centro da capital libanesa, Beirute, conhecida pelas suas ruas largas, edifícios imponentes, lojas e cafés na renovada baixa da capital, para a parte sul da cidade e de facto entrar num novo mundo.

Nessa superpovoada área, habitada pelas classes libanesas mais desfavorecidas, pósteres dos clérigos adornam as ruas, nomeadamente do falecido ayatolah iraniano. E precisamente o bastião do Hezbolah, o partido de Deus.

O grupo Hezbolah foi fundado em 1982, com o apoio e o treino dos Guardas Revolucionários do Irão. Trata-se de um grupo militante armado que combate as tropas israelitas e seus aliados libaneses e é-lhe atribuído por muitos libaneses a proeza de ter conseguido forçar a retirada das tropas israelitas do Libano em Maio de 2000.

A sua base de apoio encontra-se entre os muçulmanos libaneses shiitas, particularmente no sul, no vale de Bekaa a oriente e nos subúrbios de Beirute. O grupo esteve ligado aos atentados bombistas contra as casernas dos fuzileiros americanos em Beirute em 1983 que resultou na morte de 241 americanos.

Esteve igualmente por detrás dos atentados contra dois edifícios da embaixada dos Estados Unidos em Beirute, respectivamente em 1983 e 1984 e que resultaram na morte de mais de 80 pessoas. Acredita-se por outro lado que o Hezbolah seja responsável pelo rapto de muitos cidadãos estrangeiros no Líbano.

Para os Estados Unidos, o Hezbolah é uma organização terrorista. Um rotulo que é entretanto categoricamente rejeitado por Abdalah Kassir, um dos 12 membros do Hezbolah com assento no parlamento libanês.

Kassir disse a Voz da America, que os libaneses riem-se dessas alegações dos americanos que consideram de mera propaganda. Para este parlamentar, os libaneses conhecem e apreciam a legitimidade do Hezbolah como um movimento de resistência.

Abdalah Kassir relembra ainda que os libaneses amam o povo americano, mas não as políticas das sucessivas administrações americanas, especialmente para com Israel.

Segundo este membro do Hezbolah, os americanos acabam por ser vitimas das diabólicas políticas do seu próprio governo.

Entretanto, Kassir vai mais alem e defende que o Hezbolah não é apenas um grupo armado mas igualmente uma organização política com voz activa no parlamento em assuntos tais como o emprego, a agua potável e melhores condições habitacionais.

As sextas feiras, um homem agindo em nome do Hezbolah procede a colecta de fundos nas mesquitas e destinado as famílias daqueles que morreram no combate contra Israel.

Um gesto que se enquadra-se nos programas de caridade do Hezbolah, que inclui ainda o financiamento de escolas, hospitais e a assistência aos pequenos agricultores. Mas é entretanto a ala militar a receber a maior fatia dos fundos angariados.

No ano passado os Estados Unidos em parceria com a Franca patrocinaram uma resolução do Conselho de Segurança da ONU, propondo a retirada imediata das tropas sírias estacionadas no Líbano assim como o desarmamento das milícias, numa indirecta referencia ao Hezbolah.

Todavia não obstante a pressão internacional nesse sentido, o líder do Hezbolah, o sheik Hassan Nasrallah garante que o movimento não vai ceder.

Nasrallah apela a administração do presidente George Bush a repensar a sua política para com o Líbano e desafia inclusive os Estados Unidos a tentarem desarmar o Hezbolah.

Para provar o apoio que tem entre os libaneses, o movimento organizou recentemente na capital Beirute, uma manifestação em apoio à Síria e ao governo libanês, tido como pró Damascos. Cerca de meio milhão de manifestantes aderiram ao evento.

Samir Baroudi, professor da American University no Líbano sugere a propósito que não se perca de vista que o Hezbolah tem uma forte base de apoio no seio da sociedade libanesa.

“Penso que o Hezbolah continua a ser uma das mais poderosas organizações no Líbano. Eles têm conseguido granjear apoios as suas posições aos longos dos anos. Eles representam a maior forca política libanesa”- palavras de Samir Baroudi da American University no Líbano.

Mas existem sinais da preocupação do Hezbolah face às exigências no sentido do seu desarmamento e ainda acerca da possibilidade do governo libanês vir ser liderado por um grupo da oposição anti-siria.

Sabe-se que o sheik Nasrallah manteve a propósito conversações com varias facções políticas e recebeu garantias do líder druzo que o desarmamento do Hezbolah não figura por enquanto entre as prioridades da agenda governamental.

E ante este cenário, uma questão óbvia se levanta: com Israel e o Líbano a manterem em disputa apenas uma pequena parcela da fronteira comum, que razoes teria o Hezbolah para se manter armado ?

O professor Sami Baroudi defende que talvez se deva ao facto do Hezbolah encarar o seu papel e importância como algo que extravasa a fronteira libanesa.

“Eles consideram-se como estando a desempenhar um papel real na guerra árabe/israelita. Acham que a sua presença, a sua retórica, as suas armas de uma forma qualquer poderiam evitar que os governos árabes celebrem acordos de paz com Israel, pelo menos com base nas condições propostas actualmente”.

O Hezbolah é uma organização libanesa, mas com fortes laços ao Irão. O grupo continua a receber, de acordo com estimativas cem milhões de dólares por ano em financiamentos provenientes de Teerão.

Nizar Hamzeh especialista do Hezbolah da Universidade de Beirute defende que essa situação acaba por atribuir aquele movimento, uma importância bem mais para alem da fronteira libanesa.

“Eu não espero realmente que o desarmamento do Hezbolah aconteça sem o pronunciamento dos iranianos. A consulta será entre o Irão e o Hezbolah. Penso que esse processo de desarmamento na sua globalidade, devera obedecer a estes parâmetros... Quais são as garantias... existem garantias internas suficientes para que o Hezbolah se desarme, ou tudo isso vai requerer garantias internacionais...” frisou Nizar Hamzeh

O professor Hamzeh diz ainda que tais garantias terão decerto de vir de Washington, incluindo a de que o movimento poderá evoluir sem aparentes obstáculos para partido político, pelo que não será perseguido, por acusações passadas.

Entretanto, recentemente o presidente George Bush reiterou que os Estados Unidos continuam a encarar o Hezbolah como uma organização terrorista.

Nesta perspectiva, o professor Hamzeh, da Universidade de Beirute, relembra que o futuro do Hezbolah vai estar sempre ligado ao evoluir das relações entre Washington e Teerão, pelo que qualquer plano para o desarmamento do Hezbolah terá que ser concebido numa perspectiva regional e que dificilmente acontecerá na ausência de compromissos.

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