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Angola & FMI : as nuances do novo casamento


Um pouco à semelhança dos casais que se reconciliam e se separam com frequência, Angola e o Fundo Monetário Internacional estão de novo de mãos dadas, e desta vez ao que tudo indica, a caminho do altar.

Porém como todos os casais que andam às turras, a reconciliação, aparentemente garantida , imporá algumas obrigações sendo que Angola acarretará com a maior parte delas, senão mesmo com todas. De resto as rupturas que houve até partiram sempre do Governo angolano. Umas vezes de forma explícita ,outras de forma indirecta.

Os cortes que Luanda impunha nas suas relações com o Fundo vinham por via da suspensão unilateral dos programas monitorados, ou por via de pronunciamentos oficiais, sendo que o mais forte partiu do Presidente José Eduardo dos Santos, quando há dois anos disse textualmente à Voz da América que não era missão do FMI policiar a gestão de fundos garantidos com petróleo. “Veja, estes fundos não foram emprestados pelo FMI. São receitas próprias do Governo angolano, governo de um estado soberano, e que deve exercer a sua soberania sobre estes recursos. E o governo deve prestar contas sobre a utilização destes recursos aos outros órgãos de soberania e não ao Fundo Monetário Internacional. Portanto há ai uma actuação incorrecta do FMI, e nós temos criticado a acção policial do FMI em relação a Angola. Não é esta a missão do Fundo. Acho que não é isto que está nos seus estatutos. Estamos de acordo que tenham acesso às estatísticas sobre a nossa economia, possam fazer o acompanhamento da economia global, mas também achamos que devem ser respeitados os direitos de soberania do estado angolano.” Dias e discursos como este parece terem ficado para trás.

Aguinaldo Jaime, o enviado especial de Luanda, vendeu charme , perfume e know how, como há muito tempo Angola não fazia em Washington. Tão grande foi o enfoque na necessidade de uma reaproximação que os “acidentes do passado” foram irrelevantes nas consultas e nos contactos que manteve na capital norte-americana. A pedra de toque terá sido a constatação por Angola, de que tendo conseguido sozinha o que conseguiu até aqui.e tendo a tesouraria em baixo....é chegada a hora de voltar à conversa com o FMI.

Aguinaldo Jaime não teve nenhum rebuço em admitir isto. “o governo tem dois caminhos a seguir: Continua com o seu programa de reformas e reconstrói o país fundamentalmente com recursos próprios, ou faz apelo à assistência internacional, o que poderá tornar o processo de reconstrução e desenvolvimento do país menos custoso, e menos lento. Nós resolvemos escolher a segunda alternativa.” Esta segunda alternativa devolve também a Angola a credibilidade de que necessita para mobilizar doadores, reescalonar a sua dívida e recuperar a sua reputação , hoje por hoje tão má como nunca. Com a lição bem estudada e com os ganhos registados na economia angolana nos últimos 12 meses, Aguinaldo Jaime conseguiu criar de novo um ambiente de expectativa em Washington. Mas verdade é que apesar do que disse e do que apresentou a bola continua do lado do Governo de Angola. Aguinaldo Jaime reconheceu que há melhorias a fazer até a altura das próximas consultas. (..)“O Fundo deixou-nos algumas recomendações, em matéria de tratamento da dívida externa , transparência na gestão de recursos financeiros, disciplina de gestão de finanças públicas ,e noutras matéria tenho que dizer que o Fundo não adoptou aquela posição de fazer as recomendações e esperar para ver. Não. Pôs à nossa disposição especialistas e consultores e temos estamos a trabalhar em conjunto. E hoje é com muita satisfação que lhe digo há progressos nessas áreas...”(...) Entre os ”deveres de casa” passados à equipa económica angolana, quiçá os mais sérios constam o fim da contracção de empréstimos garantidos com petróleo, e das discussões bilaterais com alguns credores. Angola privilegiou no passado acordos bi-laterais com o Brasil a Espanha e com Portugal. A este grupo juntou a Alemanha e mais recentemente a Polónia e , uma atitude que não cai bem em Washington, sobretudo quando se constata que estes países não são membros do Clube de Paris. Logo, como justificar que Angola pague a uns e não pague a outros..? A justificação avançada por Angola, e à vista de todos, é que um acordo com o FMI será a melhor via para se resolver isto.

Mas a verdade é que enquanto Aguinaldo Jaime negociava em Washington, o PCA da SONANGOL, Manuel Vicente negociava em Londres um empréstimo que em principio deveria ser avalizado esta semana pelo ministro José Pedro de Morais , autoridade oficial na assinatura de contratos desta natureza...O empréstimo destinava-se à obtenção de dinheiro para financiamento do déficit orçamental......estamos a falar de centenas de milhões de dólares. O governo tem também em vista a obtenção de um financiamento junto da China , dedicado à recuperação dos Caminhos de Ferro de Benguela.

Esta notícia certamente não terá caído bem em Washington. Mas a verdade é que se alguma coisa ficou clara em relação a negócios que envolvam petróleo, é que por enquanto nada está claro..na entrevista que concedeu à Voz da América Aguinaldo Jaime elaborou bem a posição de Luanda sobre este assunto. “Se os entendimentos com o FMI forem alcançados, se depois se poder passar à fase de disponibilização de recursos para apoio à balança de pagamentos, disponibilização de recursos pelos doadores no âmbito da tal conferência de doadores, pois sempre nos disseram que uma das condições era haver um acordo formal com o Fundo...se esta duas componentes existirem , então cessarão de imediato recursos obtidos em condições gravosas.” Por outras palavras..estas condições ainda não existem..Conquanto esta negociação possa de alguma forma fazer mossa em Washington , ela não deverá representar um obstáculo aos passos previstos para o futuro.

Existe a perspectiva do FMI enviar uma equipa no final deste mês, e outra em Abril. A primeira vai fazer um assesment, a segunda vai no âmbito do artigo 4. Nesta altura talvez já haja condições para se começar a negociar um programa monitorado que segundo perspectivas animadoras poderá arrancar entre Junho e Julho.

A execução deste programa abrirá caminho à negociação de um outro, cuja dimensão depende apenas de Luanda. Angola deverá escolher entre um programa do tipo PRGS mais talhado para países pobres, ou um Standy By Arrangement (SBA) que segundo analistas corresponde ao estado da economia angolana ou seja...tem um rendimento médio, dispõe de receitas e tem um PIB em crescimento.

A dúvida de Angola parece resultar daquilo que cada programa representa. O SBA produz mais projecção internacional, funciona com preços de mercado, logo é mais oneroso, mas deixa Angola bem vista no mercado de capitais; O PRGS não sendo exactamente um programa de caridade, é mais barato, mas poderia levar alguns doadores internacionais a interrogarem-se porque razão Angola, que tendo o que tem, não vai para um programa mais arrojado.

Quando os funcionários do FMI desembarcarem em Luanda no final deste mês Angola já deverá ter uma opinião definitiva sobre o quer fazer. Dicas sobre isso poderão ser avançadas pelo ministro das Finanças , José Pedro de Morais que é orador convidado numa sessão do Centro de Estudos Estratégicos dos EUA, prevista para 22 de Março próximo. José Pedro de Morais que conhece bem os cantos da casa deveria visitar Washington na semana passada, mas o resultado das consultas mantidas por Aguinaldo Jaime na capital norte-americana recomendam que venha a Washington falar exclusivamente com o FMI mais tarde.

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