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ONU diz que Brasil fracassou no combate à desigualidade racial


Políticas nos últimos 20 anos não resultaram.

A Organização das Nações Unidas (ONU) afirmou nesta segunda-feria, 14, que o país "fracassou" em mudar a realidade de discriminação e da pobreza que afecta a população afro-brasileira.

Num raio-X da situação daquele sector da população apresentado hoje no Conselho de Direitos Humanos e dado a conhecer pelo jornal O Estadão, a ONU aponta que houve "um fracasso em lidar com a discriminação enraizada, exclusão e pobreza enfrentadas por essas comunidades" e denuncia a "criminalização" da população negra no Brasil.

O documento preparado pela relatora sobre Direito de Minorias da ONU, Rita Izak, indica que o mito da democracia racial continua sendo um obstáculo para se reconhecer o problema do racismo no Brasil.

"Esse mito contribuiu para o falso argumento de que a marginalização dos afro-brasileiros se dá por conta de classe social e da riqueza, e não por factores raciais e discriminação institucional", constatou a relatora.

Para Izak, "lamentavelmente, a pobreza no Brasil continua tendo uma cor".

Das 16,2 milhões de pessoas que vivem em extrema pobreza no país, 70,8 por cento são afro-brasileiros, enquanto os salários médios dos negros no Brasil são 2,4 vezes mais baixos que o dos brancos e 80 por cento dos analfabetos brasileiros são negros.

Para a relatora da ONU, os afro-brasileiros continuam no ponto mais baixo da escala socioeconómica do Brasil, apontado o facto de 64 por cento deles não completarem a educação básica.

O impacto dessa situação social é que muitos "vivem às margens da sociedade".

As cotas em diversas instituições, ainda que tenham sido elogiadas pela ONU, não foram suficientes ainda para ter um impacto maior.

Rita Izak lamenta o facto de o sistema de cotas não existir no sector legislativo e no sector judicial e também por não ser aplicável para postos de confiança.

O documento exemplifica, por exemplo, que apenas 15,7 por cento dos juízes são negros e não existe nenhum actualmente no Supremo Tribunal Federal.

Um dos aspectos tratados pela ONU é o impacto da violência nessa parcela da população, com a relatora a dizer-se "chocada com os níveis de violência no Brasil".

"Lamentavelmente, a violência tem uma clara dimensão racial", escreveu, acrescentando que dos 56 mil homicídios no Brasil por ano, 30 mil envolveram pessoas de 15 a 29 anos e desse total 77 por cento eram rapazes negros.

Investigações da ONU apontam que os números de afro-brasileiros que morreram como resultados de operações policiais em São Paulo são três vezes superiores do que é registrado com a população branca, enquanto no Rio de Janeiro 80 por cento das vítimas de homicídios resultantes de intervenções policiais são negros.

A ONU chama a atenção para o que a relatora chama de "criminalização” dos afro-brasileiros.

"Estima-se que 75 por cento da população carcerária no Brasil seja de afro-brasileiros. Estudos ainda mostram que, se condenados, afro-brasileiros são desproporcionalmente sujeitos à prisão", lê-se no documento.

Na avaliação da relatora, a proposta de redução da idade penal de 18 para 16 anos ainda "perpetuaria a criminalização da comunidade afro-brasileira".

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