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Décadas de conflito


Nas últimas semanas, o Sudão e o Senegal assinaram acordos de paz pondo termo a mais de duas décadas de conflito em cada um daqueles países.

Outros países africanos fizeram progressos ao consolidarem os seus processo de paz, depois anos de guerra. A paz que prevalece através do continente africano parece ser resultado de inspiração regional e de pressão internacional. Mas há dois pontos de conflito que podem gerar a desestabilização generalizada.

Das planícies do Sudão, na África Oriental às florestas da África Ocidental, a paz parece estar a difundir-se através do continente africano. Duas das mais longas guerras africanas terminaram em Dezembro último, quando o governo do Senegal formalmente pôs termo ao conflito com os separatistas da região de Casamança. E, este mês, o governo do Sudão e o Movimento Popular de Libertação Sudanês assinaram um acordo de paz para pôr fim a uma guerra que fez mais de dois milhões de mortos.

Lazaro Sumbeiywo, o mediador chefe do processo de paz para o Sudão, afirma que se assiste em África a uma mudança fundamental. ”É uma questão geracional. As pessoas estão a olhar para si próprias e interrogam-se: ”O que é que está errado connosco?”. E, consequentemente, mostram-se capazes de resolver os seus próprios problemas.”

A magnitude e as implicações das guerras no continente africano são impressionantes. Apenas na última década, mais de 20 países na África Su-Sahariana estiveram em guerra, na maior parte dos casos dentro das suas próprias fronteiras. Milhões de pessoas morreram e vários milhões mais perderam as suas casas e o seu ganha pão.

Hoje em dia, em África, a guerra continua na região sudanesa de Darfur. Há conflitos latentes na Somália, no Uganda, no Chade e no enclave angolano de Cabinda. Há acordo de cessar-fogo instáveis noutros países, como é o caso do Congo e da Costa do Marfim, e um acordo frágil acordo de paz celebrado entre a Etiópia e a Eritréia. Apesar da presença ameaçadora de um grupo rebelde, no Burundi está em marcha um processo de desarmamento depois de mais de uma década de guerra.

Ahmed Rajab, editor da revista ”Africa Analysis”, de Londres, afirma que uma combinação de factores levou às mudanças em curso no continente africano. ”Primeiro que tudo, o terem chegado à conclusão de que os africanos tinham de pegar o touro pelos cornos para resolver os seus próprios problemas, em vez de confiar em estranhos, e depois porque os africanos sabem que o mundo está cansado de verem sempre na TV aquelas imagens negativas sobre conflitos em África. E as pessoas não estão preparadas, os não-africanos, a dar dinheiro, a fazer investimentos e tudo isto é negativo para o desenvolvimento do continente.”

Rajab deu igualmente crédito ao trabalho da União Africana e à liderança dos presidentes Olusegun Obasanjo, da Nigéria, Alpha Oumar Konare, do Mali, e Thabo Mbeki, da África do Sul na promoção da paz.

”Vimos como é que o presidente Obasanjo interveio em S. Tomé para desfazer o último golpe de Estado que ali teve lugar. De facto, foi um esforço quase isolado com uma pequena ajuda do presidente Thabo Mbeki. Mas ambos conseguiram fazer com que os líderes do golpe reconsiderassem. E vemos muita coisa deste género a acontecer nas conversações de paz da Somália, em Nairobi, por exemplo. Eles reuniram as pessoas todas ali: os antigos senhores da guerra, os políticos tradicionais e outros e partiram lenha até que se chegou a uma solução, embora imperfeita, porque sabemos que o governo da Somália ainda tem a sua sede em Nairobi. Mas é um avanço. Podemos ver que existe um movimento em direcção à paz, um movimento em direcção à sanidade e ao bom senso.”

Em conjunção com a União Africana, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental tem desempenhado um papel importante na manutenção da paz na região. As suas forças receberam apoio financeiro e logístico por parte da ONU, dos EUA, da União Europeia e de outras fontes.

O desaparecimento de personalidades de carisma, mais do que manutenção da paz, tem vindo a pôr termo a alguns conflitos africanos. Depois de Charles Taylor ter sido forçado a demitir-se de presidente da Libéria, em 2003, a guerra civil terminou abruptamente. Em Angola, as armas calaram-se depois que o líder rebelde Jonas Savimbi foi morto, em 2002.

Na frente internacional, a aplicação de sanções tornou mais difícil fazer guerras. Da mesma forma se tem revelado eficaz o corte dos lucros provenientes dos chamados diamantes manchados de sangue para financiar conflitos. Os tribunais internacionais patrocinados pela ONU para o Ruanda e Serra Leoa julgaram, envergonharam e mandaram para a prisão os autores de crimes de guerra.

Ao nível das bases, Ahmed Rajab da revista ”Africa Analysis”, afirma que organizações não governamentais ao nível local foram determinantes em gerar mudanças positivas ao nível das comunidades.

”De certo modo, as pessoas deram a entender aos líderes que o seu apoio não é garantido porque as pessoas questionam a governação, a responsabilização e os recursos e a forma como esses recursos podem ser partilhados com igualdade entre os vários grupos de interesse nesses países.”

Apesar dos ganhos recentes que trouxeram a paz a vários países africanos, os analistas advertem de que acordos de cessar-fogo instáveis no Congo e na Costa do Marfim podem ter consequências devastadoras de vasto alcance. E afirmam ainda que o regresso á guerra na Costa do Marfim pode desestabilizar a vizinha Libéria e a Serra Leoa, ambos os países a recuperar de vários anos de guerra. E a Guiné-Bissau poderá ser igualmente arrastada.

O Congo tem vindo a ser afectado por combates esporádicos no Leste do território. Analistas afirmam que o regresso à guerra poderá também incendiar conflitos com os países vizinhos: o Burundi e o Ruanda, este a recuperar de um genocídio de mais de 800 mil pessoas há uma década atrás.

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