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Cabinda carece de investimentos de vulto - 2004-03-19


“Cabinda carece de investimentos de vulto para a melhoria das condições de vida das populações”

Cabinda produz mais de 80 por cento do petróleo angolano, um recurso cujo peso nas finanças e na economia global do pais e por todos sobejamente conhecido.

Entretanto, na província e no centro de um acalorado debate, que acaba por mobilizar o enclave do Miconje ao Yema, vozes existem que encaram os benefícios directos da exploração petrolífera para as populações locais, como muito aquém do esperado.. a fazer-se fé no ainda incipiente, volume de investimentos públicos directos efectuados na província.

Este e outros aspectos ligados à situação económica e social da província, foram o tema de uma entrevista concedida pelo governador de Cabinda, Aníbal Rocha a VOA.

O governador provincial começa por fazer o balanço dos dois primeiros anos da sua gestão da província.

AR: Quando chegamos encontramos a província numa situação de instabilidade em termos políticos - militares. Neste momento a província esta efectivamente mais estável. Naquela altura as nossas fronteiras estavam desguarnecidas, havia incursões dos rebeldes a partir das fronteiras vizinhas, por outro lado era o garimpo e a pilhagem dos nossos recursos de forma desenfreada e hoje depois das operações militares e da policia nacional ter tomado controlo das nossas fronteiras, e evidente que a situação alterou-se substancialmente. Embora ainda exista um diferendo, mas politicamente estamos no bom caminho, para o inicio do dialogo, por forma a que se consiga a pacificação plena da província.

VOA: Foi - lhe entregue a administração de Cabinda, por sinal uma província com um peso acentuado nas receitas do estado angolano. Se lhe pedisse que traçasse um panorama da relação causa efeito, entre o potencial económico de Cabinda e os investimentos públicos realizados, o que diria ?

AR: O governo estabeleceu uma percentagem que e atribuída à província, proveniente das receitas fiscais do petróleo. Essa percentagem tendo sido aplicada em função dos programas do governo provincial. E e verdade que conseguimos resultados muito positivos em termos de infra-estruturas. Isto só para lhe dizer que neste momento, Cabinda é das províncias do país que em termos de infra-estruturas escolares, suplanta. Tem uma substancial rede sanitária. Foram feitos investimentos no sector das aguas, mas como sabe as necessidades são cada vez mais prementes. Penso que hoje, para as necessidades das populações locais, esse valor mostra-se exíguo para fazer face a estas necessidades e carências locais. Este é entretanto um assunto que está sendo tratado e tem estado a merecer uma análise dentro de um programa global que o governo, sob a recomendação do Sr. Presidente da Republica está a preparar para a província de Cabinda e decorrente do qual serão eventualmente injectados mais verbas para fazer face aos problemas que ainda persistem na província.

VOA: Mas sabe que na base das reivindicações políticas dos cabindas tem estado o incipiente volume de investimentos públicos realizados na província. Tem igualmente essa percepção das coisas ?

AR: Concordo perfeitamente ! Cabinda necessita por exemplo de um porto comercial de longo curto, como sabe o cais actual para alem de ser obsoleto não serve as necessidades reais da província. Portanto isto e o exemplo de um investimento de vulto de que Cabinda carece que e efectivamente necessário para a melhoria da qualidade de vida da população. Há necessidade também de procurarmos melhorar as estradas internacionais, que ligam a província a Ponte Negra, a Delosie e mesmo a RDC. São infra-estruturas que necessitam de melhoramentos substancias, por forma a que o fluxo de mercadorias e pessoas se faca de forma mais fluida. Há necessidade de facto de Cabinda ter um centro universitário, para os jovens. Há necessidade de melhoramentos no aeroporto, algo que entretanto já esta em andamento. Há a questão da energia. Neste aspecto já existem estudos bastante adiantados para que possamos beneficiar de energia produzida pela barragem do Inga. Portanto corroboro perfeitamente dessa sua analise, mas devo dizer que são situações para as quais já existem soluções gizadas pelo governo provincial e central.

VOA: Falando de um dos aspectos, talvez o mais bicudo da sua administração. Refiro-me a explosão demográfica de que a província tem vindo a ser alvo, decorrente por certo da onda de emigração de cidadãos dos países vizinhos, devido à própria permeabilidade das fronteiras internacionais de Cabinda e da situação de instabilidade político - militar na província, do qual resulta um crescente êxodo rural... Que peso terão esses dois factores, no, diria complicar da administração de uma província com as características de Cabinda ?

AR: Muito ! Por exemplo se visitar o hospital central de Cabinda, facilmente se apercebera que em cada cem parturientes da maternidade local, cerca de 60 a 70 são cidadãs das RDC. Se for ao mercado formal, vai notar que grande parte dos mercadores são cidadãos dos países vizinhos. Obviamente que isso desestabiliza a vida local. Nos temos estado a adoptar algumas medidas administrativas. Temos estado a manter contactos com alguns dos nossos homólogos da RDC e estamos de facto a discutir esta questão que se tornou num fardo bastante pesado para a nossa gestão da província. Estamos a tentar por cobro a essa situação através de um controlo mais efectivo das nossas fronteiras. Obviamente, e como sabe a razão deste fluxo migratório tem a haver com a situação de instabilidade vivida nos países vizinhos, de onde são originários esses imigrantes. O êxodo rural para as cidades, tem a haver com o melhoramento das condições rurais. Temos alguns programas que visam estancar essa problemática. Mas e bom que se diga, de que se trata de um cenário vivido em todo o pais e que decorre como e sobejamente conhecido da situação de guerra vivida no pais nos últimos anos.

VOA: Cabinda tem direito, a luz de alguns acertos do passado, a 10 por cento das receitas fiscais do petróleo produzido na província. Face à evolução da capacidade de produção petrolífera da província, isto e dos 300 mil barris diários de há dez anos atras, a produção petrolífera local ascende hoje aos 800 mil barris ... Não acha que se está perante a necessidade de uma rápida renegociação do acordo, por forma a que Cabinda possa beneficiar de uma tranche maior das receitas petrolíferas locais ?

AR: Esta percentagem a que se refere, devo dizer que ela não oscila ou aumenta em função da produção petrolífera local. Foi um valor indicativo que se decidiu estabelecer para Cabinda e que independentemente da oscilação do preço do petróleo ou da produção tem sido estanque e temos estado a usufruir dela há mais de dez anos. Obviamente que a situação de há dez anos e totalmente diferente da actual. As coisas são totalmente diferentes, as necessidades são outras. Durante esse período fizeram-se muitas infra-estruturas, que necessitam de manutenção, as necessidades começam a aumentar e novos investimentos começam a ser necessário .Eu de facto sou um defensor de que os valores que são atribuídos à província e provenientes das receitas do petróleo são insuficientes e não se compadecem com a actual situação. Como sabe para alem dessa fonte existe uma outra fonte que são as receitas que a província vai cobrando e que são valores substancias. Já há instruções superiores para que possamos, quando necessário recorrer a essa fonte para alimentar algumas acções concretas na província que estejam inscritas no orçamento geral do estado.

VOA: Falando da relação Governo Provincial, Companhias Petrolíferas, satisfeita com essa parceria, não obstante o visível isolamento face às populações a que essas companhias, neste caso a Chevron-Texaco, se confinaram... a ponto de algumas vozes criticas chegarem a considerar os campos petrolíferos do Malongo de uma espécie de Guantanamo, a Cabinda ?

AR: Referindo-me ao isolamento das populações locais a que as companhias petrolíferas se confinaram, devo dizer que e verídico. Mas já existe a intenção de transformar essa pratica. Existe um projecto para a construção de uma cidade própria, já temos os espaços cedidos. Penso que muito em breve se vai dar inicio a essas construções e seria uma forma muito interessante de podermos acabar com este divorcio. Também sei que a transportação do próprio pessoal muito em breve vai começar a ser feito pelas vias normais. E concerteza que isso ira puxar para o desenvolvimento da cidade por um lado e por outro vai possibilitar um intercâmbio directo que e necessário entre as varias culturas. Relativamente à parceria com a Chevron-Texaco. Devo dizer que esta petrolífera tem trabalhado em alguns projectos sociais, de acordo com os programas do governo. Nos últimos anos, alguns dos projectos sociais, disseminados por áreas bastante recônditas que foram financiados por essa parceria petrolífera. A Chevron Texaco tem-se manifestado interessado em vários projectos de desenvolvimento local e inclusive em eventuais comparticipações financeiras nas mesmas.

Entrevista conduzida por Nelson Herbert, em Cabinda.

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