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Mulheres Muçulmanas em França: Vítimas do Machismo?


Uma série de incidentes amplamente publicados que envolviam mulheres muçulmanas reforçou a percepção popular de que está a se enraizar uma forma de Islamismo machista e intolerante em França – onde se encontra a maior comunidade muçulmana da Europa. Muçulmanos e especialistas, contudo, dizem que as mulheres islâmicas são frequentemente estereotipadas de forma incorrecta.

Como a maioria das mulheres jovens, Wafa Ben Salem sai para ir ao cinema e ao restaurante, namora – apesar de sempre sair com uma acompanhante quando vai namorar – e considera-se uma especialista em moda. Salem, porém, é diferente de muitas jovens francesas – ela cobre seu corpo e cabeça com panos e lenços e mantém o seu voto de castidade até o casamento.

Estudante universitária do sul da França, Ben Salem diz que “as mulheres que não são virgens antes do casamento são mal-olhadas pelo Islão”. Como muçulmana praticante, ela diz que seguirá todas as suas restrições. Ela pode namorar e casar-se com o marido que escolher, mas permanecerá casta até o dia de seu casamento.

As questões de castidade e modéstia no Islão foram muito debatidas na França nas semanas recentes. Primeiro, um tribunal de Lille, cidade no norte da França, anulou o casamento de um casal muçulmano quando o marido alegou que a mulher não era virgem no dia de seu casamento. O acontecimento provocou uma grande revolta.

Mais recentemente, o Conselho de Estado – o mais alto órgão administrativo do país – decidiu barrar a cidadania francesa a mulheres muçulmanas marroquinas que vestem a burqa (ou niqab), vestuário que cobre todo o rosto da mulher. Foi argumentado que esta “prática radical” era incompatível com os valores franceses. A Ministra das políticas urbanas Fadela Amara – muçulmana praticante de descendência algeriana – apoiou a decisão, ao chamar o niqab de um “símbolo de opressão das mulheres”.

Muitos outros incidentes, incluindo alegações de que um marido muçulmano proibiu um médico de fazer uma cesariana de emergência na sua esposa, ajudaram a reforçar percepções de que mulheres muçulmanas em França estão a viver sob a autoridade de seus maridos.

Mas analistas como Franck Fregosi, um sociólogo que escreveu extensivamente sobre o Islamismo, advertem as pessoas contra estereótipos facilmente fabricados.

Fregosi diz que, longe de serem submissas, muitas mulheres muçulmanas em França e em outros países europeus procuram um equilíbrio entre a fé e a sociedade laica em que vivem. Ele diz que muitas raparigas namoram – mas escondem o facto das famílias, as quais vêm das sociedades conservadoras da Turquia ou do norte da África.

Fregosi diz que algumas jovens têm relações sexuais antes do casamento, mas tentam manter as aparências para que suas famílias não descubram. Segundo reportagens na imprensa, um número crescente de mulheres muçulmanas na Europa opta por uma cirurgia para reparar o hímen. Assim, terá a aparência de virgem quando se casar.

Fregosi acrescenta que muitas jovens devotas se distanciam de suas tradições culturais – inclusive de casamentos pré-arranjados pelos pais. Ele diz que elas mesmas preferem escolher um marido piedoso, não um primo ou outro homem escolhido por sua família.

A comunidade muçulmana de cinco milhões de membros na França mostrou diferentes reacções a respeito do casamento anulado em Lille e do incidente do niqab. Muitos não são praticantes fervorosos. Uma pesquisa feita em 2006 pelo instituto de sondagem CSA descobriu que, apesar de quase 9 em cada 10 muçulmanos acompanharem o mês de jejum do Ramadão, apenas 17% vai à mesquita regularmente. E 90% disse que aprova a ideia de igualdade dos sexos.

Dounia Bouzar, antropóloga especialista em questões muçulmanas, diz que mesmo o clérigo muçulmano na França concorda que, no caso de Lille, o marido deveria ter resolvido o problema da virgindade de sua mulher discretamente, não perante a justiça.

A estudante Ben Salem concorda e diz que, se uma mulher não é virgem antes de seu casamento, o assunto não diz respeito a mais ninguém a não ser a ela e Deus. Mas acredita que muitos franceses consideraram erroneamente o anulamento como outro exemplo do preconceito do Islão contra mulheres.

Ben Salem diz que a imprensa francesa é particularmente muito rápida em criar estereótipos de mulheres muçulmanas devotas como ela; que elas nunca saem de casa; que são subjugadas por homens; que não sabem de nada. Ela diz que isso, simplesmente, não é verdade.

A antropóloga Bouzar concorda. Ela diz que existem muitos preconceitos fáceis e errados contra mulheres muçulmanas em França. Ela diz que apesar de que muitas estão a tornar-se mais devotas, também elas questionam o modelo ocidental de liberdade sexual e se realmente representa uma maior liberdade.

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